Atenção contém spoilers!
Olho por olho, dente por dente. A
lei de talião, tão antiga, nunca se fez tão presente na atualidade. Repetida
nas casas, nas esquinas ao se visualizar uma manchete, uma notícia trazendo
detalhes sobre a morte com requintes de crueldade do assassino."Bem feito!", "esse mereceu", "isso ainda foi pouco", "deveria ter feito pior", é o que ouvimos.
O episódio 2, da 2ª temporada da
série Black Mirror, aborda com excelência a temática.
Na história, Victoria Skillane
está sozinha em uma casa, da qual não consegue se lembrar de nada. Saindo,
encontra diversos “espectadores”, pessoas que a filmam com o celular e não
esboçam qualquer reação. Desesperada, pedindo por ajuda, se vê perseguida por
um grupo de pessoas mascaradas, que tentam matá-la. Consegue ajuda de duas
pessoas que não estão “hipnotizadas”, e portanto tem controle dos próprios atos.
Se une a elas, em uma missão, na tentativa de derrubar o que quer que esteja
hipnotizando as pessoas e transformando-as em espectadores. Entretanto, ao
chegar no local, descobre que tudo não passa de uma armação, e que na verdade
esta é sua punição, por participar no assassinato de uma criança, juntamente
com seu namorado, e sua punição é agonizar todos os dias, revivendo o que fez
com a criança, sendo uma espectadora na sua agonia, sem, entretanto, nunca
lembrar-se de nada, já que ao fim de cada dia ela passa por uma terapia de
choque que a faz esquecer suas memórias. A vingança ocorre no chamado “Parque
da Justiça”, e todas os espectadores são pessoas convocadas a fazerem parte da ‘atração’.
O cenário lembra o pano de fundo
de Michel Foucalt, em sua obra “Vigiar e Punir”. Nela, Damiens, um parricida*,
recebe como punição as agonias mais atrozes, tendo partes do corpo arrancadas e
queimadas com ferro líquido, sendo ao fim desmembrado, e por fim jogado na
fogueira.
A história, desperta diversas
reações: de um lado, muito acreditam ser a punição justa, afinal, Victoria deve pagar, perpetuamente,
pelo crime que cometeu; de outro, consideram a punição injusta, e a tortura
psicológica algo tão ofensivo e ultrajante quanto o crime por ela cometido.
Diante desse impasse, muitos se perguntam ou até afirmam: por que não fazemos
isso?
Toda a história trazida pelo
episódio representa o chamado ‘direito penal do inimigo’: uma forma em que o
Estado, suprime absolutamente qualquer direito do transgressor como pessoa, e o
castiga, severamente, sem qualquer parâmetro ou limite, apenas para satisfazer
a ânsia por vingança social.
Bom, algo que faz parte, do convívio
social, é a organização e o respeito às leis. Uma sociedade sem leis se torna o
caos. Um Estado que não tem leis, que flexibiliza essas leis a ponto de cometer
atrocidades em nome da vingança se desestabiliza como governo, entrando em
guerra contra si mesmo.
Portanto, além de um análise
emocional, mas em uma análise sociológica, a punição de Victoria é sim injusta.
O papel do Estado é promover a justiça social, punindo o transgressor pelo ato
cometido como uma retribuição, ao mesmo tempo em que o reabilita para sua volta
à sociedade. Pois agindo como uma forma de vingança, torturando o assassino,
não estaria o Estado se tornando aquilo que deve punir? Como pode então fazer
aquilo que ele mesmo proíbe? Agindo dessa forma entraria em contradição consigo
mesmo, não é verdade?
Por fim, é claro que como pessoa,
seria hipócrita dizer ao assassino de um ente querido, familiar “Não quero que
ele sofra”. Mas como jurista, como cidadã, entendo a crítica do episódio como
até onde pode ir o Estado, como instrumento de justiça social, para satisfazer
os anseios da sociedade por vingança? Até que ponto ele pode violar seus
próprios fundamentos e suas leis para satisfazer o desejo por sangue do homem?
Fica para reflexão.
E você, o que achou do episódio?
Não deixe de comentar!
“Há uma grande diferença entre justiça e vingança:
A vingança é algo que deve ser evitado. É doentia, é destrutiva.A justiça é algo que te torna harmônico. É necessária, libertadora.”
Alexandre Cardoso
*pessoa que mata o pai.
Adorei sua análise!
ResponderExcluirNo final do episódio a pessoa fica surpresa por estar com pena de alguém que fez o que ela fez, mas ao mesmo tempo (eu) achei sacanagem fazerem aquilo com ela. Até pq, como vc falou, o Estado tem a função de reabilitar a pessoa para q ela nao possa cometer o mesmo erro novamente, porém o que o Estado tava fazendo mesmo era traumatizar a garota né, sem contar q ela nem se lembrava do q tinha feito, ou seja, era meio sem sentido aquela punição.
Enfim, essa série é ótima!
Fico feliz que gostou Tayna! Excelente colocação! Com certeza, a série surpreende a cada episódio!
ExcluirAdorei sua análise!
ResponderExcluirNo final do episódio a pessoa fica surpresa por estar com pena de alguém que fez o que ela fez, mas ao mesmo tempo (eu) achei sacanagem fazerem aquilo com ela. Até pq, como vc falou, o Estado tem a função de reabilitar a pessoa para q ela nao possa cometer o mesmo erro novamente, porém o que o Estado tava fazendo mesmo era traumatizar a garota né, sem contar q ela nem se lembrava do q tinha feito, ou seja, era meio sem sentido aquela punição.
Enfim, essa série é ótima!